Artigo/Entrevista
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“ Ponta de São Lourenço, a flora que persiste ”
A vegetação da Ponta de São Lourenço contrasta com a floresta verdejante e arbórea, pela qual é conhecida a ilha da Madeira.A paisagem ímpar da Ponta mais oriental da ilha da Madeira tem atraído, com o passar dos anos, cada vez mais a atenção dos nossos visitantes. Denominada por muitos de “Dragon’s Tail” (cauda de dragão), a península que se estende ao longo de 9 km, englobando os ilhéus do Desembarcadouro e do Farol, é reconhecida internacionalmente pelo seu relevo e pela sua paisagem inóspita.
O panorama, de aparência quase marciana, despertou o interesse de algumas produções cinematográficas de ficção científica, tendo sido escolhido, mais recentemente, como o palco de uma das novas séries da Disney.
Mas porque razão é que esta paisagem contrasta tanto com o resto da ilha?
Geologicamente falando, a atividade vulcânica de tipo fissural que deu origem a este braço de terra ocorreu há cerca de 0,70 – 5,57 milhões de anos. Ou seja, apesar de não ser a parte mais antiga da ilha, é certamente a mais fustigada pelos alísios de nordeste. Os ventos, as marés do Atlântico e a inexistência de uma barreira física contra estas forças erosivas moldam diariamente a forma única desta península, contribuindo fortemente para a aridez deste território. Contudo, a vida persiste!
A vegetação da Ponta de São Lourenço, constituída por espécies rasteiras e arbustivas de pequeno porte, contrasta com a floresta verdejante e arbórea, pela qual é conhecida a ilha da Madeira.
No entanto, estão identificadas mais de 160 plantas vasculares diferentes, sendo que algumas delas são exclusivas desta extensão de território. Imposta pelo tipo de solo extremamente rochoso, que impera nesta zona, a flora que aqui habita é caraterizada pela sua resiliência, visto estar perfeitamente adaptada à alta exposição e ao clima oceânico seco que se faz sentir no leste da ilha.
Nos meses estivais, a aparência desértica e os tons ocres predominam. Os descampados repletos de gramíneas movem-se com a leve brisa do Atlântico e os solos e os caules das plantas preenchem-se de inúmeros invertebrados e moluscos.
Com a chegada das chuvas e a descida das temperaturas, a mudança cromática da paisagem inicia-se. Por entre os cardos (Silybum marianum) avistam-se milhares de abelhas que continuam o seu trabalho de polinizadoras. A vegetação começa a vibrar e os terrenos outrora secos tornam-se verdes, pontilhados de florescências de variadas cores: púrpuras, amarelas e brancas.
O goivo-da-rocha (Matthiola maderensis) com as suas flores roxas e brancas, a vaqueira (Calendula maderensis) com os seus tons amarelos e a estreleira (Argyranthemum pinnatifidum succulentum) com as suas pétalas brancas são as mais comummente encontradas. Pontualmente, ainda é possível observar o “Orgulho da Madeira”, como os ingleses o dominam, o nosso massaroco de baixa altitude (Echium nervosum).
No entanto, a pérola deste local é a perpétua de São Lourenço. Como o próprio nome indica, a Helichrysum devium é endémica e exclusiva a esta zona. Além da sua beleza ornamental, esta planta está a ser alvo de um estudo no Centro de Química da Madeira, visto que as espécies pertencentes ao gênero Helichrysum têm uma caraterística especial: contêm compostos que poderão estar na base do tratamento da diabetes. Ressalvando a importância da conservação deste habitat e de todos os seus constituintes, não só para o bem do planeta e para a preservação da biodiversidade, mas também para o nosso.
Escrito por João Martinho para a edição de 21/05/2024 da Revista Wilder.
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